Chopis Centis

Penso que para pedir um chopp na Vivenda do Camarão é porque o sujeito já desistiu das alegrias da vida faz tempo.

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Bernardo Kircove
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Chopis Centis

Coisa mais deprimente é ver alguém tomando chopp na praça de alimentação do shopping. A luz branca, a cena plastificada, o Burger King - nada é menos convidativo. Penso que para pedir um chopp na Vivenda do Camarão é porque o sujeito já desistiu das alegrias da vida faz tempo.

Na escala de cenário ideal para o chopp, no mais alto degrau está o entardecer pós-praia em um tradicional bar de Ipanema, onde o serviço é uma bosta e o bolinho de bacalhau é maravilhoso. Na última colocação, o shopping. Logo atrás da festa de criança em play de prédio com decoração dos Vingadores.


Eu odeio os shoppings, e também os amo. A começar pelo ódio, que é mais simples: ora, como não odiar? Representam o que há de mais errado na modernidade. Dentro de um shopping, não se sabe se você está em São Paulo, Recife, Filadélfia ou Barcelona. Expurga qualquer indício cultural, qualquer resquício de charme, até sobrar apenas o suco do capitalismo ocidental, um emaranhado de logotipos, cores quentes e gordura hidrogenada.


Mas, convenhamos, o que há de não se amar em um shopping? Trata-se do ápice da conveniência. Em uma tacada, você é capaz de resolver sua falta de cuecas, substituir o varal de roupas que quebrou na última tempestade, reclamar sem êxito na sua operadora de celular e ainda comprar o presente da sua sobrinha, que está atrasado tem três semanas e vem sendo adiado porque, sabe como é, você odeia shopping.


Eu vou ao shopping porque eu compro minhas camisas na Hering desde sempre, e no shopping tem Hering. A ideia de sair à rua caçando uma Hering me dá calafrios. Em qual esquina estará a loja? Qual será seu horário de funcionamento? Em qual bairro tem Hering, afinal? Terá lugar para estacionar? Nenhuma camisa preta lisa tamanho M merece hercúleo esforço mental e físico. Esteja você na Filadélfia ou em Bangu, o shopping é sua melhor chance de encontrar uma Hering sem estresse.


Claro, ainda há razão mais nobre da existência do shopping: ele tira as lojas das ruas. A rua deveria ser um lugar sagrado, reservado para bares, restaurantes, museus, praças e outros estabelecimentos onde tomar um chopp configura lazer da mais alta qualidade. Fosse eu prefeito, baixaria um decreto proibindo Herings e Lupos nas ruas, provendo no mesmo texto generosas isenções fiscais para quem estivesse disposto a abrir um boteco bem simpático na cidade. Às lojas, estariam reservados os entornos das escadas rolantes — uma espécia de apartheid contra as franquias.


Declaro todo respeito aos shoppings, portanto, desde que aceitem sua condição de resolvedores dos pequenos afazeres cotidianos, nunca de protagonista dos prazeres da vida. Do contrário, seu garçom, me vê um chopp, uma camiseta preta lisa tamanho M e um Cheddar McMelt, por favor.

 

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